This piece was written by Noelani Bernal after reading the novel “Maria Altamira” in PORT297, taught by Ana Lima.
Entre todos os textos que a gente leu este trimestre, eu gostei mais do livro Maria Altamira por Maria José Silveira. Acho que a autora conta a história da dupla Alelí e Maria Altamira dum jeito fácil de entender mas também interessante. A mãe e a filha são vítimas do descuido do governo, e como as duas têm origem indígena e são de baixa renda, também representam a destruição devagar e óbvia das culturas indígenas e da classe trabalhadora, especialmente na Amazônia. O que eu mais gostei do livro foram os papéis fortes das protagonistas femininas e o jeito pelo qual Silveira descreve as perspectivas complicadas em volta da construção da barragem de Belo Monte.
Maria Altamira é o único romance que eu já achei que se centraliza na barragem de Belo Monte. Por isso, acho muito legal que as perspectivas principais venham da mãe e da filha ao longo de mais ou menos 35 anos em vez de contar a historia desde o ponto de vista dum homem. Tomando em conta o contexto a violência que foi causada pelo desenvolvimento do Rio Xingú, a voz da mulher é bastante relevante. Muitas vezes, em casos de desenvolvimento rápido, como no de Belo Monte, as mulheres são as mais afetadas, direta e indiretamente, pelas consequências negativas. As mulheres sofrem por causa das mudanças na economia, já que depois de serem deslocadas ou perder o trabalho, várias ficam com uma opção só para poder ganhar dinheiro para elas mesmas e as famílias: a prostituição. Além de participar nessa economia informal e perigosa, quando os homens perdem o trabalho—justamente o que aconteceu quando terminaram de construir a usina—as taxas de mulheres abusadas em casa sobem. E ainda pior, muitas mulheres têm medo de denunciar aos seus abusadores. Ou como vimos no romance, Maria Altamira tenta denunciar o estuprador e a polícia não faz nada. Sem proteção suficiente, as mulheres sofrem mais do que os demais, e acho muito importante que a autora sobressalte isso nos pontos de vista de Alelí e Maria Altamira.
O contexto violento e a falta de apoio são óbvios no romance. Começa no Peru com Alelí, que perdeu tudo como adolescente e não recebe nada do governo ou das organizações que deveriam ajudá-la. Ela vive só para sobreviver para o resto da vida dela e, porque sempre está em situações precárias, lida com várias instâncias da violência sexual e assalto. Está acostumada a viver assim, então quando acha comunidade com a tribo Juruna, não quer ficar lá e correr o risco de perder tudo de novo. Na verdade, Maria Altamira cresce com mais oportunidades. Ela tem a oportunidade de estar em São Paulo e tem uma vida mais estável do que a mãe. Em vez de fugir, ela escolhe voltar para Altamira e aprender mais sobre as suas raízes Juruna para melhor entender o que está perdendo toda vez que o Belo Monte destrói outra parte da natureza. Mas, ainda é vítima da violência sexual e não é levada a sério por causa de ser mulher quando tenta procurar o assassino do seu pai. A Mãe Chica, cujo bem-estar é importante para Maria, perde o trabalho, a casa, e é ameaçada por traficantes. As mulheres mais importantes neste romance demonstram as consequências dum governo que descuida das populações da baixa renda, especialmente as com origens indígenas. Mas como mulheres elas também representam um subgrupo que é um dos mais impactados pela pobreza extrema e falta de apoio, exactamente o que aconteceu com a construção da usina de Belo Monte.
Silveira também captura os sentimentos conflitantes que se revelam nas conversas sobre o Belo Monte e o desenvolvimento em geral. Obviamente, a autora adota um ponto de vista que está contra o tipo de desenvolvimento que está ocorrendo na Amazônia. As vidas de Alelí e Maria Altamira são muito piores depois da destruição da natureza causada pelo desenvolvimento. Manu, o pai de Maria, foi morto por um pistoleiro porque ele estava atrapalhando a expansão dos pistoleiros e os desmatadores nas terras indígenas. Aquele acontecimento—a violência contra os povos indígenas—é um dos exemplos de como a violência segue os conflitos sobre a conservação da terra. Maria tem uma conexão intrínseca com a sua terra e sente-se bastante conectada à água da região. Toda vez que percebe mais dano feito às terras de Altamira, o coração dela se parte ainda mais. Os inspetores que aparecem ao longo do conto parecem ignorantes e egoístas, especialmente porque o leitor sabe quanto Maria ama a terra e quanto os projetos estão piorando a qualidade de vida para milhares de pessoas. O romance é fundamente contra esse tipo de desenvolvimento.
O leitor entende muito melhor os efeitos negativos da usina, mas é ainda mais importante notar que Silveira incorpora outras perspectivas. Fazendo isso, o livro contextualiza as dificuldades e as complexidades do desenvolvimento melhor porque, mesmo que beneficie as empresas e o governo, também melhora a vida de vários trabalhadores. O exemplo mais óbvio é a amiga de Maria, Nice. Nice é uma das milhares de pessoas que pegaram trabalho na construção da usina e seguraram um salário estável. Segundo ela, a vida melhorou depois que chegou a barragem. Isso foi a realidade para mais de sessenta milhares de pessoas. Esse número chegou até Altamira entre 2010 e 2015 para trabalhar em Belo Monte, e não inclui o número de pessoas locais que também começaram emprego lá. Especialmente para as pessoas que perderam o emprego que tinham antes do desenvolvimento, trabalhar em Belo Monte se converteu numa opção ótima. Não sabemos o que vai acontecer com Nice depois de terminar a construção, mas várias pessoas certamente ficaram sem emprego depois que terminaram de construir a usina. Hoje, Altamira tem muitos problemas com o aumento do tráfico ilegal porque mais ou menos um terço dos trabalhadores que chegaram para trabalhar ficaram depois. Vários trabalhadores eram homens jovens, e porque não tiveram empregos, muitos estão juntando-se aos traficantes. A taxa de violência contra mulheres também tem aumentado bastante na última década. Nice é de Altamira, mas baseado no contexto de Altamira hoje, a gente pode supor que os efeitos positivos não perduraram ao longo dos últimos anos para ela. Além disso, outro benefício irônico da barragem no conto é que Maria conhece a seu marido futuro, Jurandir, numa reunião com os amigos de Nice, todos eles trabalhadores em Belo Monte. O piloto mudou para a região para o trabalho também e servia como um piloto para os inspetores. Mesmo que Maria mostre para Jurandir as injustiças causadas pela usina, não teriam se conhecido sem a chegada do Belo Monte. Silveira sobressalta os resultados devastadores da barragem, mas também admite que existe outras perspectivas complicadas e importantes na discussão do desenvolvimento.
Para resumir, Maria Altamira serve como um exemplo literário das injustiças acontecendo na Amazônia, especialmente a violência contra as mulheres e os povos indígenas. Muita gente vive nas classes mais baixas da sociedade como Alelí e não recebe o apoio necessário para superar a pobreza depois de ser vitimizada e ignorada pelo governo e os corpos corporativos. Silveira também incorpora pontos de vistas diferentes entre os moradores de Altamira para pintar melhor a complexidade das opiniões do assunto. Contar a historia das pessoas de Altamira através de um romance faz que a informação seja mais acessível ao público. Um exemplo recente, já que o desenvolvimento de Belo Monte aconteceu em nove anos, Maria Altamira nos pede para refletir nos projetos que ocorrem na Amazônia todo dia, particulamente os que não são vistos como tragédias sociais e do meio-ambiente porque o governo fala que ajudam o desenvolvimento sustentável do país.